Romantismo Crônico
Escrito por
Isadora Bispo
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Só quem sofre dessa anomalia sabe a dificuldade que passa. Os olhares tortos que recebe e os nomes maldosos. Nem me lembro quando fui diagnosticada, mas os sintomas são constantes. Coração acelerado por bobagens, expectativas insuperáveis, suspiros sem razão aparente e memórias nunca vividas criadas meticulosamente antes de dormir. As causas? Muito provavelmente as mesmas músicas que falam sempre das mesmas coisas, filmes da Disney vistos até a fita não resistir mais e várias pilhas de livros apaixonantes na estante. O tratamento? Geralmente um toque de realidade e decepções, que só tornam a coisa pior, fazer o que? Corações partidos rendem boas histórias, só para quem escuta é claro. Mas e a cura? É nessa hora que o médico sai da sala, anda até a família e com pesar diz:
- É crônico, sinto muito. Não há mais nada que possamos fazer.
Exagerado? É um dos sintomas. Mas não confunda essa anomalia com o brega, pois não estão entre os sintomas: grandiosas declarações em público, carros com loucuras de amor ou serenatas na janela. Não mesmo. Um romântico, é apaixonado pelos detalhes e se agarra a eles com todas as forças, é sonhador por natureza, sempre imaginando possíveis situações. Pois nunca se sabe quando irá surgir a oportunidade de recriar a cena daquele livro. Nunca se sabe quando algo extraordinário pode acontecer. Um estranho poderia muito bem virar a esquina agora só para esbarrar na garota por quem iria se apaixonar daqui um mês. Muito possível.
Mas a verdade é que o grande inimigo não é o romantismo, é a expectativa. Ela é traiçoeira como o mar que te conduz até a imensidão do azul pra te afogar nas suas próprias ondas. A expectativa é esperar pelo improvável e depositar nas pessoas uma responsabilidade que pertence à você. É voar alto demais e perceber que as asas não funcionam mais segundos antes de despencar. É ter que lidar com o fato de que os diálogos serão sempre mais interessantes no cinema, que a rosa azul que você viu outro dia não vai ser um presente seu e que aquele texto que você queria tanto que te escrevessem nunca vai chegar. Mas ele continua lá, o romantismo não morre em meio a decepção, muito pelo contrário, ele queima ainda mais. A dor, até ela se torna bonita também, o sentimento vira poesia, música, história...Intensidade é o sinônimo perfeito, mas às vezes, ela consome por dentro.
E ao recém chegado, não se assuste, você não é o alvo do meu romantismo. Será sempre assim, com ou sem você. Mas a gente aprender até onde pode ir depois de um tempo. Aprende a colocar pelo menos um dos pés no chão, caso contrário, não seríamos nós mesmos. Sensíveis e fortes. Apaixonados e contidos. E não pense menos de mim, não me vitimize. Essa anomalia nunca foi mais forte do que eu. Não preciso ser salva da torre, o castelo é todo meu. Não saia correndo com a espada na mão, já derrotei muitos dragões sozinha. Não me acorde com um beijo, eu não caí na dá bruxa má. E não me venha com conto de fadas,eu já li os irmãos Grimm. Mas pode trazer o ''se cuida'' na despedida, o filme que te fez lembrar de mim naquela tarde de domingo e o verso que você fez às duas da manhã. Porque o maior sintoma dessa anomalia é estar sempre apaixonado, mesmo que não tenha ninguém por quem se apaixonar