"Os Fantasmas Ainda se Divertem" é uma grande miscelânea de tudo o que torna Tim Burton icônico
Escrito por
Lilia Fitipaldi
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Afastado da direção de longas-metragens, os últimos trabalhos de Burton como diretor incluem Grandes Olhos (2014), O Lar das Crianças Peculiares (2016), Alice Através do Espelho (2016), Dumbo (2019) e a série da Netflix Wandinha (2022), na qual ele não apenas dirigiu os quatro primeiros episódios, mas também assinou a produção. A série, inclusive, foi responsável por restaurar sua confiança na indústria cinematográfica, segundo o próprio Burton.
Revigorado após Wandinha, Tim Burton retorna aos cinemas com Os Fantasmas Ainda se Divertem - Beetlejuice Beetlejuice, sequência direta do filme de 1988. Na trama, as mulheres da família Deetz — Lydia (Winona Ryder), Delia (Catherine O’Hara) e Astrid (Jenna Ortega) — são obrigadas a se reunir em Winter River, sua antiga casa, após uma perda repentina.
Lydia agora é uma médium conhecida por seu programa de TV, onde entra em casas mal-assombradas e mostra como seus moradores vivos "convivem" com os fantasmas. Tudo isso enquanto ela mesma é "aterrorizada" por assombrações novas e outras muito bem conhecidas, como um certo diabrete de roupa listrada. O trabalho de Lydia complica ainda mais sua relação com sua filha, Astrid, que não apenas descrê no dom da mãe, como também a ressente por sua incapacidade de se comunicar com o falecido marido, pai de Astrid.
É intrigante ver as personagens de Ryder e Ortega vivendo uma dinâmica um pouco semelhante à que Lydia e Delia tinham no longa de 1988, ainda que as personalidades da versão adolescente de Lydia e Astrid sejam bem distintas.
O elenco original, composto por Catherine O’Hara, Winona Ryder e Michael Keaton, permanece tão sintonizado com seus personagens que é um completo deleite vê-los novamente em cena. O’Hara, com sua artística e narcisista Delia, torna a trama mais hilária; Winona nos apresenta uma versão mais madura, porém continuamente excêntrica, de Lydia; e Keaton mostra que sua melhor vertente — a cômica — continua afiada, esbanjando conforto na pele do bioexorcista. Ryder e Keaton deixam claro que são os verdadeiros "donos da história", tal como no primeiro filme.
Já o elenco de “novatos” inclui os já muito conhecidos Willem Dafoe, Justin Theroux, Monica Bellucci e a própria Wandinha da série de Tim Burton, Jenna Ortega. Dafoe interpreta Wolf Jackson, um ator que sempre realizava suas próprias cenas de ação, dispensando dublês, o que acabou levando à sua morte, rendendo-lhe o cargo de “Chefe de Polícia do Pós-Vida.” Theroux vive Rory, o namorado/produtor do programa de TV de Lydia, um completo oportunista. Ortega interpreta a rebelde, antissocial e “pseudoambientalista” filha adolescente de Lydia, Astrid Deetz, que, tal qual a personagem de Winona no antigo longa, também funciona de certa forma como uma espécie de “ponte” entre os vivos e os mortos. É Monica Bellucci, no entanto, que vive a novidade mais instigante do longa; Bellucci interpreta Delores, a misteriosa e vingativa ex-esposa de Beetlejuice, que busca enlouquecidamente a alma do ex-marido. A Delores de Bellucci rouba a cena e provoca suspiros e “arrepios” toda vez que aparece, mas seu arco é pouco explorado, o que faz com que ela funcione de maneira limitada como a “vilã” que o longa aparentemente propunha.
O novo filme se arrisca ao ambientar um pouco mais o mundo do “pós-vida”. Toda a direção de arte e os cenários do primeiro filme são levemente expandidos na trama. Entretanto, esse acaba sendo o único risco do longa, cujo roteiro, escrito pela dupla Alfred Gough & Miles Millar (Wandinha), juntamente com Seth Grahame-Smith (Orgulho e Preconceito e Zumbis), não aproveita tanto os novos personagens e se apoia nos conhecidos, explorando completamente a nostalgia.
Os efeitos práticos do filme completam o clima nostálgico, lembrando os primórdios dos filmes de Burton, mas também são complementados com as novas tecnologias da modernidade.
Beetlejuice Beetlejuice tem toda aquela essência que deu voz aos “esquisitos” e toda a marca registrada que fez Tim Burton ser quem é: puro coração, diversão e estapafúrdio, o que por si só já justifica a fé recém-restaurada do diretor no cinema.
Nota: 4/5